BRASIL: DE COLLOR À FALTA DE UMA POLÍTICA PARA O MERCADO INTERNACIONAL
Por: Joice Quadros
A gestão do ex-presidente Fernando Collor de Mello (1990/1992) foi um divisor de águas no comércio internacional para o Brasil. Com seus pontos positivos e equívocos. Hoje, o País ainda sofre pela falta de uma política industrial para o mercado externo. Por outro lado, as empresas não podem ver as exportações apenas como solução para momentos de dificuldade no mercado interno. A presidente da Câmara de Comércio Exterior da Fiesc, Maria Tereza Bustmanente, a Maitê, detalha o que pensa sobre estes temas.
Quando se fala no ex-presidente Fernando Collor de Mello, vem logo à memória os cara-pintadas e o movimento pelo seu impeachment. Mas, teve o outro e importante legado deixado por Collor, que foi a radical mudança na política do mercado internacional do Brasil, ocorrida no início dos anos 90. Com seus acertos e equívocos. “Não há dúvidas que a gestão do ex-presidente Collor foi um divisor de águas. O Brasil não podia continuar de costas para o mercado internacional”, analisa Maitê Bustamante. O Mundo vivia a onda da globalização e Collor decidiu abrir o mercado interno à importação, reduzindo tarifas dos produtos importados e quebrando o protecionismo que cercava a indústria brasileira. Os produtos importados começaram a fazer a festa no bolso dos brasileiros, pelos seus preços mais acessíveis.
Mas, se foi necessário, foi também um processo muito mal conduzido. “Houve o grande equívoco de ser uma decisão intempestiva, sem discussão com a sociedade, para que acontecesse de uma forma programada e organizada”, pontua Maitê. Tanto que a indústria nacional foi substituída da noite para o dia pelas importações. Muitas empresas quebraram e outras nem se criaram, como a nascente de componentes eletrônicos, que acabou sendo extinta pela concorrência internacional. “Nosso custo era alto e as tarifas de importação reduzidas”, lembra Maitê, travando a indústria brasileira.
Ano das Reformas
Isto tudo aconteceu há quase 30 anos. Tempo suficiente para o País implementar uma política industrial voltada para o mercado externo. Mas não aconteceu. “Falta uma política industrial voltada para o mercado externo. Nossos custos são altos”, destaca Maitê. O já famoso e conhecido “Custo Brasil” continua nas alturas. Por mais que se esforcem e melhorem sua produtividade, as empresas nacionais ainda perdem em competitividade no mercado internacional devido, principalmente, a alta carga tributária e falta de infraestrutura adequada.
“Hoje, o que se espera, mesmo que não sejam reformas completas, são melhorias tributárias e trabalhistas, aumentando a competitividade e reduzindo o custo frente ao mercado internacional”, destaca Maitê. Estas reformas, que devem entrar na agenda do Congresso Nacional neste ano, mexem na política fiscal “permitindo que as empresas olhem com mais confiança e construam alianças estratégicas”, diz Maitê Bustamante, referindo-se ao mercado internacional.
Bom momento
Alguns analistas sugerem que estamos vivendo um “bom momento” para se voltar ao mercado externo devido a baixa demanda no mercado interno. Sobre este assunto, Maitê Bustamante é categórica: “A exportação não deve ser vista como solução para momentos que a demanda no mercado interno está fraca. Tem que fazer um planejamento estratégico”. Ela explica que é um longo processo a conquista do mercado externo e a empresa terá muito mais facilidade para exportar se permanecer nele.
Com as importações, a regra é a mesma. “A importação permite que as empresas reduzam seus custos”, pontua, destacando também a fidelização dos mercados. Sobre os principais países com oportunidades de negócios, destaca a Índia, para onde estão se voltando os olhos do mundo, e a China, que continua a merecer toda a atenção e deverá crescer, no mínimo, este ano, entre 5% e 7% por cento.
Quanto a recente posse de Donald Trump na presidência dos Estados Unidos, analisa que seus atos devem vir a atingir mais a volatilidade dos mercados financeiros. Isto, porque os investidores são muitos sensíveis às mudanças que ocorrem nos países e às falas de autoridades. Já os relacionamentos comerciais entre empresas e países, que são estabelecidos por regras internacionais, tendem a não sofrer tantas interferências. De qualquer forma, o que está ocorrendo é um grande movimento protecionista nos países, e Donald Trump está com este foco para os Estados Unidos. Empresas e países terão que continuar aprendendo a lidar com incertezas. “No mercado financeiro, a gangorra será constante”.
BALANÇA COMERCIAL: NEM TUDO QUE RELUZ É OURO
Se é verdade que se pode comemorar o superávit da Balança Comercial Brasileira, por outro lado nem sempre os números refletem a realidade econômica do país.
Em 2016, por exemplo, a Balança Comercial apresentou um superávit de US$ 47,692 bi, o maior em toda a série histórica medida pelo Banco Central Brasileiro (Bacen). Número considerável para um resultado que estava negativo em US$ 3,959 bi, em 2014. Entretanto, observe-se que, apesar do superávit positivo em 2016, tanto exportações como importações caíram, revelando queda geral nos negócios.
Sobre o tema, o economista José Rubens Vicari, do site “Senhor Gestão”, lista alguns pontos que “de certa forma tiram o brilho destes números” e lista:
• As exportações acumuladas em US$ caíram 3,7% versus o ano de 2015.
• As importações caíram muito mais -24,7%- em razão da recessão econômica e também do encarecimento dos produtos importados devido à desvalorização do real.
• As commodities que sustentam as vendas externas, de modo geral, tiveram quedas nos preços – soja -3.7%; minério de ferro -22,8%; carnes de frango e boi -9%; celulose -10,4% e café -3%. O preço médio do açúcar decresceu 0,9% na média de janeiro/agosto 2016 versus mesmo período de 2015.
E conclui: “O Brasil continua extremamente dependente do desempenho das commodities para fechar as contas. Historicamente não nos distanciamos muito do que já acontecia no século XX quando o café reinava no comércio exterior e nossa evolução desde então ainda não mudou significativamente o perfil das exportações com produtos de maior valor agregado e mais tecnologia”.
A abertura na década de 1990
Dez anos antes, na década de 1980, a abertura comercial já era vista como inevitável, devido ao esgotamento do processo de substituição de importações. Havia um consenso que o livre comércio poderia proporcionar desenvolvimento com a melhoria da qualidade de vida da população e gerar crescimento econômico e melhorar a eficiência da indústria.
Essa abertura se intensificou a partir de 1990, principalmente no Governo Collor, com redução tarifária de importação e exportação, além da eliminação de várias barreiras não-tarifárias. Mas, esta decisão sem planejamento do governo, encontrou grande parte dos setores da economia brasileira em atraso tecnológico, se comparado com padrões internacionais.
É feita uma análise que a abertura comercial do Brasil se diferenciou das demais em países subdesenvolvidos (Chile e Argentina na década de 1970, por exemplo), pois não aconteceu em um ambiente de economia estável e tampouco foi realizada primeiro a liberalização do mercado de bens e serviços para apenas depois liberalizar o mercado de capitais.
A abertura, então, trouxe benefícios imediato aos consumidores pela maior disponibilidade de bens e serviços, com melhores preços e tecnologia. Por outro lado, a abertura também provocou um desafio para os produtores locais, que, para não fechar suas empresas, foram em busca de novas tecnologias e melhorias em seus sistemas de gestão. É um período em que as importações superam as exportações, quando a indústria nacional parte em busca de melhor qualidade para competir no mercado internacional.
O PIB e o mercado externo
Outro dado a se considerar é o que representam as importações mais exportações em relação ao Produto Interno Bruto (PIB) de um país. Na Coreia do Sul é 50%, seguida pela Alemanha 45%; Canadá 31%; Reino Unido 30%; França 30%; Itália 30%; Índia 25% e China 25%. No mesmo período, o total de exportações e importações brasileiras sobre o PIB representou, em média, apenas 11,5%.
Pela análise do economista José Rubens Vicari, o impacto do “alto” Custo Brasil necessita ser mitigado, pois a energia é cara; a logística e infraestrutura não ajudam; a mão de obra custa acima da média dos países menos desenvolvidos considerando os encargos sociais; a taxa cambial é volátil e a carga tributária pune as exportações”. Todos fatores que atrasam uma maior inserção do Brasil no vasto mercado internacional e precisam ser corrigidos com uma política industrial para o mercado externo, como seguidamente enfatiza a presidente da Câmara de Comércio Exterior da Fiesc, Maria Tereza Bustamante.